Autora: Laine Ferreira
É curioso o tipo de
reflexão que surge na mente após cada pequena experiência e contato com outras
pessoas. Gosto sempre de aproveitar cada pedacinho de vida e momento para fazer
uma atualização rápida nos velhos pensamentos, e assistindo o filme
“Libertador” – cotado para uma indicação de Melhor Filme Estrangeiro no Óscar
de 2015, do diretor Alberto Arvelo, estrelado pelo ator venezuelano Edgar
Ramírez no papel do militar e político
Simón Bolívar, que foi o líder da maior das revoluções contra o imperialismo espanhol
na América Latina, pude ter uma nova porção
de introspecções imaginativas correndo soltas pelo cérebro. Não venho aqui
querendo elogiar ou criticar o filme, esta é pura e simplesmente uma análise do
que senti ao conhecer Bolívar pelos olhos de Arvelo.
Confesso que simpatizei
pelo homem idealista, que a princípio carregava no peito uma vontade apaixonada
de lutar pelas mudanças que acreditava. Bolívar tinha essa urgência de
transformar o mundo que todos nós jovens temos, mas como muitos de nós seus
ideais aos poucos se mostraram bem mais difíceis de colocar em prática do que o
imaginado. Seus sonhos de liberdade e união para a América do Sul, vendidos em
seus discursos ao povo falavam diretamente ás emoções e anseios daquela gente
sofrida que escutava-o e imediatamente acolhia suas palavras como suas, pois
deles também eram aquelas expectativas de uma grande nação forte e justa.
A cena do filme que mais
me impactou e causou pontos de interrogação na cabeça, foi uma na qual ele após
ser capturado pelo exército espanhol, recebe como punição o exílio para a
cidade de Cartagena despojado de toda sua fortuna e prestígio social. Lá, ele
que havia sido aristocrata, se viu em meio um ambiente hostil e precisou se
adaptar. Não se iluda e nem imagine as belas praias, água de coco e resorts que
hoje colorem as famosas praias colombianas, o coitado foi parar no meio da
selva, e lá depois de perder tudo, ganhou um novo mundo, um novo eu. Seu
momento catártico foi o roubo de suas botas, onde houve o confronto de seus
valores com os seus interesses pessoais, na exata hora que ele entendeu o
significado de dividir e do quão brutal é a força do querer e luta pela
sobrevivência. A meu ver, neste emblemático momento, nasceu o revolucionário,
apesar de Simón já estar em meio as batalhas, só a partir da perda de seu
último e mais importante bem – seus sapatos, ele realmente se tornou líder da busca
da dignidade de sua terra. Afinal, pergunto-lhes eu, de que somos feitos todos nós
senão de desejos, sonhos e lutas?
A grande pergunta que me
veio à baila é: De quanto estamos dispostos a abrir mão para que os demais
possam viver, e não apenas sobreviver? Imediatamente imaginei se seria, eu
própria, capaz de ter menos conforto e bens para que outros irmãos pudessem ter
casa e comida. Imaginei se poderia dispensar o carro, para alimentar crianças
órfãs, imaginei se teria coragem de vender algum bem para curar alguns dos
seres que morrem a míngua e sem esperança nas filas de hospitais ou mesmo em
seus casebres velhos, no meio das ruas, sem uma palavra de consolo, sem um
gesto de compaixão. Perguntei-me enfim, qual a liberdade desejo para nossa
sociedade e se nela caberiam todos os homens, ou apenas o meu ego feliz numa
casa a beira do mar, escrevendo e curtindo a vida. No final de minha incursão
ao meu âmago, defrontada pelas perguntas que temo encarar as respostas, Simone
de Beauvoir me disse baixinho ao pé da imaginação a única verdade
suficientemente razoável de se escolher: “Querer ser livre é também querer
livres os outros”.